O Dr. Frigdiano Álvaro Durántez Prados presta entrevista ao programa Somos a UNIC, ao vivo na rádio Bié

O Dr. Frigdiano Álvaro Durántez Prados presta entrevista ao programa Somos a UNIC, ao vivo na rádio Bié

Depois de uma aula magna do dia 30 de junho, no Campus Universitário, o Dr. Frigdiano Álvaro Durántez Prados respondeu ao desafio de oferecer uma entrevista ao vivo no programa Somos a UNIC, na rádio Bié do Grupo Rádio Difusão de Angola, a qual partilhamos com todos os internautas:

Como está a ser a sua experiência em Angola, no Bié e especialmente na UNIC?

– Está a ser uma experiência fantástica, eu já tinha grandes expectativas porque felizmente conhecia em linhas gerais o que viemos fazer aqui e a importância estratégica desta Universidade no coração de Angola. Portanto, está a ser uma semana de trabalho verdadeiramente muito frutífera e muito boa, desde várias perspectivas. Desde a perspectiva de conhecer uma nova realidade angolana de educação superior no centro do país, um investimento extraordinário da Fundação Universitária Ibero-americana (FUNIBER) em prol dos estudantes de toda Angola, até a perspectiva de impulsionar, fomentar e dar a conhecer a ideia da Iberofonia e o facto de que Angola pertence a um grande continente e tem uma diversidade muito forte que pode partilhar com todos os países não somente de língua portuguesa mas também os de língua espanhola; e o facto de poder dar esta notícia aqui tem sido realmente satisfatório.

Qual é a base ou fundamento para a articulação de um espaço de países de língua portuguesa e espanhola sem exceções geográficas?

– A base, como estávamos a falar ontem na palestra principal, é que o português e o espanhol são as únicas grandes línguas internacionais (grandes em termos quantitativos, faladas por mais de 100 milhões de pessoas) que são ao mesmo tempo reciprocamente compreensíveis em linhas gerais. O que quer dizer isso? Que não somos 260 milhões de lusófonos ou 600 milhões de hispanófonos: somos mais de 850 milhões de iberofalantes. As nossas línguas são tão similares que se entendem reciprocamente, são como duas formas de falar a mesma língua; é isso que temos de extraordinário de modo que, desde Angola podemos articular marcos de cooperação com Chile, México ou Argentina noutro lado do Atlântico, como na própria Espanha. De facto, na Universidade Internacional do Cuanza temos professores de Chile, Cuba, de países hispanofalantes que interagem perfeitamente com os nossos estudantes angolanos lusófonos.

Como este projecto ou tendência multinacional beneficia os povos de expressão oficial de línguas portuguesa e espanhola?

– No mundo há uma série de comunidades de base cultural e linguística. Por exemplo, a própria CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa). Quais são em geral os propósitos, os objectivos deste tipo de comunidades? São a concertação político-diplomática e a cooperação em todos os âmbitos possíveis. Normalmente estes países pertencem a âmbitos geoeconômicos diferentes; então temos que procurar, desde aquilo que temos em comum e aquilo que partilhamos, o que podemos fazer juntos. Esta seria a teoria. Para ser mais directo, direi que o mesmo que na CPLP, só que num âmbito muito maior; temos os mesmos objectivos, os mesmos pontos de conexão, mas isto é muito mais universal porque estamos falando de países desde o Cabo Verde até o Chile, até a Espanha, até o Timor, etc.

Qual é a relação de intercompreensão entre espanhol e português?

– Bem, talvez os senhores jornalistas sejam os mais indicados para falarem para mim se se compreende quando falo espanhol ou não (risos). O que acontece precisamente é que como esta não é uma questão matemática, esta intercompreensão não é perfeitamente simétrica é tem um aspecto assimétrico, de tal maneira que o lusófono-nativo normalmente percebe muito bem o espanhol por uma razão fonética e da habilidade da vossa língua, do português. Portanto, os lusófonos-nativos percebem muito bem o espanhol, enquanto os hispanofalantes não percebem tão correctamente o português, mas por uma questão puramente fonética por causa das nossas vogais, das nossas consoantes, etc. Então, há uma vantagem subjectiva para o falante lusófono, mas há uma circunstância ou vantagem objectiva para a língua espanhola porque a língua espanhola é automaticamente compreendida desde o México até Moçambique, directamente.

Como articular este grande espaço de concertação e cooperação que defende?

– Em termos institucionais temos que partir das instituições internacionais, das organizações internacionais existentes; então, temos dois grandes grupos, por assim falar: Por um lado, a Comunidade Ibero-americana de Nações, que associa os países de línguas espanhola e portuguesa, mas somente da América e Europa, ou seja, os falantes de português do Brasil e de Portugal. Em segundo lugar, a CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), integrada pelos países de expressão oficial portuguesa de todo o mundo, de todos os continentes. Entre estas duas comunidades conjuntamente conformam precisamente este mundo de línguas espanhola e portuguesa, este mundo iberófono ou da iberofonia, espaço pan-ibérico, o mundo ibérico, entre as duas comunidades fazem isto. Então, uma das maneiras de articular esta aproximação em termos institucionais é simplesmente a ampliação da Comunidade Ibero-americana em termos linguísticos de modo que aos 22 países de línguas espanhola e portuguesa da América e Europa possam aderir de igual modo os países de língua portuguesa de África e Timor-Oriental, mas também a República hispano-falante da Guiné-Equatorial. Há uma derivada como particularmente Angola deveria impulsionar isto, talvez poderemos falar disto mais tarde.

Qual é o papel de Angola neste contexto? Como o nosso país pode contribuir para articular ou promover este espaço?

– Em marco geral, Angola é um país muito importante na geopolítica africana, tem uma visão geopolítica, tem um grande peso internacional no continente africano especialmente, tem influência ascendente nos PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa) e na Guiné-Equatorial, tem uma vinculação histórica muito grande com o Brasil, sendo que este último é o principal país de língua portuguesa e de todos os iberófonos do mundo, é o principal país da CPLP e principal país também da Comunidade Iberoamericana em termos territoriais, demográficos, económicos, geopolítico, etc. E porque o Brasil está geograficamente situado entre os países hispano-americanos e os lusófono-africanos. Portanto, esta vinculação histórica privilegiará, esses vínculos entre a Angola e o Brasil que são muito importantes para isto. A Angola, além disso é um grande país com uma visão internacional. Qual é o seu papel mais concreto?

O papel de Angola pode ser em termos diplomáticos impulsionar esta vinculação ibero-americana com África iberófona. Como pode fazer especificamente? Bom, quais são as chaves de tudo isto? As chaves estão em duas organizações internacionais ibero-americanas que são: a Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI), por assim dizer, a UNESCO Ibero-americana, e a Organização Ibero-americana de Segurança Social (OISS). Bem, estes dois organismos, estas duas organizações internacionais formam parte da Comunidade Ibero-americana, e nestes dois organismos a República africana hispanofalante da Guiné-Equatorial é membro pleno. Portanto, nunca poderia negar-se a incorporação de Angola a estes organismos como país africano iberofalante quando já temos um país africano iberofalante que é membro pleno. Se se negasse seria uma sorte de discriminação que seria inaceitável.

Quer dizer, se amanhã Angola solicita a sua integração, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, (mas estou a falar de Angola não somente porque estamos aqui, mas pela sua influência internacional); se Angola fala com a Guiné-Equatorial particularmente (porque Angola apoiou muito a incorporação da Guiné-Equatorial à CPLP), se Angola fala com a Guiné-Equatorial, fala com o Brasil, fala com a Espanha, fala com a Colômbia e com outros países para se integrar na organização dos Estados Ibero-americanos… Não existe impedimento nenhum de fundo para que isso seja possível, estamos às portas abertas da articulação desses grandes países africanos no espaço da Iberofonia no âmbito da cooperação educativa, cultural e científica se quiserem os diplomatas desses países; e no caso da Organização Iberoamericana de Segurança Social é o mesmo: posso dizer que ainda é mais fácil porque os estatutos desta organização permitem a incorporação directa dos países africanos de língua portuguesa. É uma questão de vontade política.

Qual é a posição da Comunidade dos Países de Língua Portuguesas e da Comunidade Ibero-americana de Nações perante esta realidade?

– Neste momento a CPLP e a Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, Ciência e a Cultura são observadores reciprocamente, isto é, são sócios, são associados com uma vontade de aproximação. É evidente que já tem um reflexo institucional. Nesta altura, além disso também está a fazer-se aproximação institucional normativa entre a Secretaria Geral Ibero-americana (SEGIB), que é o organismo que prepara as cimeiras de Chefes de Estados e de Governos Iberoamericanos, e a CPLP. Neste momento, a seguir, a SEGIB vai ser observadora associada da CPLP e a CPLP vai ser observadora associada da SEGIB. Isto é, esta é outra maneira também de articular todo este mundo de línguas espanhola e portuguesa, mas a forma por assim dizer “perfeita” seria a organização, a articulação de um único espaço onde todos os países seriam por igual, sem que houvesse países duplamente representados.

O que os governos fazem, ou o que pensam sobre esta realidade? Existe algum planejamento nesse sentido?

– Mesmo que a aproximação entre países lusófonos e hispanofalantes seja uma realidade evidente, de facto está a acontecer quase sozinha por causa das afinidades, por causa da natureza das nossas proximidades e com o trabalho de movimentos na sociedade civil, de pessoas, professores, associações, organizações que estão a ver claramente; e há ao mesmo tempo uma clara movimentação natural de aproximação entre os países iberófonos. No entanto, temos que reconhecer que até o presente momento quase não existe uma planificação oficial, com alguma possível exceção. E isto é o que estamos a reclamar e dizer porque se isto é bom para todos, por que não o fazemos. E acabo de dar duas chaves, e poderia ser feito simplesmente durante os próximos meses.

Por um lado, como dizia, a Organização Ibero-americana de Segurança Social admite directamente pelos seus estatutos a incorporação dos países africanos de língua portuguesa. Por outro lado, a Organização dos Estados Ibero-americanos, que têm a Guiné-Equatorial como membro pleno, não tem nenhum impedimento de carácter substantivo para isto mesmo, para incorporar como membros plenos os países lusófonos africanos e Timor-Leste. Mesmo que neste momento o seu regulamento descreva os nomes concretos individualizados dos países que são membros, incluindo a Guiné Equatorial, isto pode ser facilmente modificado amanhã para aderirem os países de língua portuguesa de África. Isso pode ser feito, por certo, no mês de Novembro quando será feita a modificação do estatuto desse organismo.

O que a sociedade civil de nossos países faz ou pode fazer neste contexto?

– Nós somos sociedade civil aqui na Universidade Internacional do Cuanza e já estamos a fazer palestras, estamos a fazer estas entrevistas, estamos a fazer tudo isto. Isso é uma coisa evidente, mas temos que impulsionar mais. No caso da Espanha e outros países, há anos existem organizações que têm impulsado esta aproximação, como por exemplo a Associação Pan-Ibérica de Academias Olímpicas, mas a grande novidade e diferença entre o espaço Ibero-americano e o espaço de toda Iberofonia está aqui, está na África, por isso é tão importante que a iniciativa surja, se impulsione desde a África e neste sentido quero dizer também que todos nas nossas sociedades soberanas e os nossos países, é uma decisão também de vocês. Estou a sugerir uma coisa que nós podemos concordar, é uma possibilidade que deve ser estudada se querem, tem que ser explorada e executada. É uma decisão soberana de cada Estado.

É diretor de Relações Institucionais da Fundação Universitária Ibero-americana, FUNIBER: como esta organização promove este ideal? E a Universidade Internacional do Cuanza?

– Neste caso, relacionado com a pergunta anterior, nós temos formalizado desde o mês de fevereiro a Cátedra FUNIBER de Estudos Ibero-americanos e da Iberofonia, que está composta por esta Universidade africana, que é lusófona, mas também hispanofalante porque todos os nossos alunos estudam o idioma espanhol no primeiro ano do curso. Na Cátedra participam igualmente a Universidade Internacional Ibero-americana do México (UNINI-MX), a Universidade Internacional Iberoamericana do Porto Rico (UNIB), a Fundação Internacional Ibero-americana da Colômbia (UNINCOL), e a Universidade Europeia do Atlântico (Espanha). Esta Cátedra que é interdisciplinar, intercontinental, interuniversitária e é bilíngue, é a primeira Cátedra do mundo que tem como objecto de estudo todo este espaço da Iberofonia. Tudo isso é muito importante porque vamos fazer cursos, mestrados e doutorados, espaços de conferências como a que ocorreu ontem, etc. Então, a mesma FUNIBER tem esta presença em todos os países de língua espanhola e portuguesa basicamente, não somente por estas universidades que fiz menção, mas pela sua presencia internacional; a FUNIBER tem sedes em todos os países Ibero-americanos, mas também aqui em Angola, na capital, Luanda, em Maputo, Moçambique, e estamos a pensar já em abrir delegações em países como Cabo-Verde, Marrocos, Guiné-Equatorial. Este mundo todo da Iberofonia em termos institucionais da nossa Fundação vai estar bem prestigiado.

Realizou a conferência sobre a Comunidade dos Países de Línguas Espanhola e Portuguesa e a Acção de Angola: Uma Oportunidade Estratégica. Qual é a avaliação que faz, qual é a imagem que leva de Angola e principalmente do Bié?

– A minha impressão é magnífica… O Governador da província do Bié falou para mim que houve 500 pessoas que não puderam entrar na aula. No entanto, obrigado pela divulgação que vocês fizeram dessa minha palestra (risos), mas isso também foi percebido que é uma coisa de muito interesse para todos, 500 pessoas não é fácil reunir toda esta gente, e aqui, no centro de Angola, porque não estamos na capital de Angola. Foi uma experiência muito boa, na qual eu estou a reconfirmar o que já sabíamos por outros âmbitos como quando há uns meses reuniram-se os altos representantes da Justiças de todos os nossos países nas Ilhas Canárias. E falavam desde a Bolívia à Timor-Leste, cada um na sua língua, desde Angola à Espanha todos falando na sua língua perfeitamente num exercício político diplomático fantástico. E agora estamos a ver isto numa área que está mais afastada das áreas tradicionais da costa onde há mais gente, como Luanda onde há mais população e vimos que este inter-relacionamento é o mesmo em todos os nossos países.

Muito obrigado!